Enquanto o terrorismo volta no Oriente Médio e no Ocidente, o governo petista continua com sua ideia fixa: defender sempre a pior ditadura
Ninguém duvida de que o atentado terrorista em massa do Hamas a Israel foi financiado pelo Irã. Sem o regime de Teerã, o Hamas não poderia fazer um ataque aéreo tão intenso a ponto de ultrapassar a Cúpula de Ferro israelense, não teria os mísseis Khaibar-1 e Fajr usados no ataque, nem teria treinamento de solo longe dos olhos das Forças de Defesa de Israel. É o Irã que financia boa parte do terrorismo mundo afora.
A geopolítica do Oriente Médio tem Teerã como epicentro. O islamismo político — e jihadista — tornou-se a maior força da região. O que o Brasil tem a ver com isso? Infelizmente, bastante. E cada vez mais.
O Brasil possui laços culturais ou históricos tênues com o Oriente Médio. Mesmo assim, a diplomacia petista é extremamente aguerrida na região. Desde o início do primeiro governo Lula, a idée fixe da nova diplomacia era ser “ativa e altiva”, como definiu o chanceler Celso Amorim, já experiente à época. Ou seja, meter o seu bedelho onde não é chamado e favorecer toda sorte de ditadura e regime cruel, matando gays, mulheres, crianças — enquanto repete tanto “democracia” porta adentro, para ser tratado como vítima de velhinhas pela mídia e pelo Judiiciário.
O que é ser “ativo e altivo”? Não mais estar do lado do Ocidente democrático — este imperialista — mas favorecer os piores regimes do planeta. Como o Irã consegue financiar tantas armas e ações militares, se vive sob pesadíssimas sanções da ONU? Com uma bela ajudinha brasileira.
Apenas do primeiro ao último ano do governo Lula, as exportações para o país persa subiram 144%. Uma visita do ditador Ahmadinejad ao Brasil foi cuidadosamente arquitetada para se evitar críticas da mídia pela aproximação com o Irã, como confessa o então chanceler Celso Amorim em suas memórias. No último 11 de setembro (parece que simbolismos básicos são muito obscuros para políticos), Geraldo Alckmin, o vice-presidente, assinou um acordo de Cooperação Técnica entre o Brasil e a Organização para a Libertação da Palestina — não o Hamas, mas sempre os movimentos que querem dirimir a influência do Ocidente democrático na região. Alguns com sérios problemas com judeus. E, claro, a pressão brasileira para que Teerã conseguisse o seu programa nuclear.
Pergunta a Lula | O que o Brasil ganharia ao favorecer a ditadura de Ahmadinejad e de Ali Khamenei?
Em um de seus livros de memórias, ominosamente chamado Teerã, Ramalá e Doha: Memórias da política externa ativa e altiva, o chanceler Celso Amorim revela monomania da nova diplomacia petista: conseguir que o Brasil não fosse mais visto como um agente neutro, mas metesse cada vez mais o bedelho no Oriente Médio — e em encrencas para as quais não havia sido convidado, graças a Deus, Alá e Yaveh.
O primeiro passo para o Brasil ser visto “ativa e altivamente” seria a ajudinha para Teerã conseguir enriquecer urânio sem punição. Por que os aiatolás e o ditador Ahmadinejad queriam tanto urânio enriquecido, ao invés de conseguir tanto ou mais economicamente sem sanções internacionais? A dúvida nem sequer é aventada por Amorim. O que importava era conseguir “o direito legítimo” (sic) de enriquecer urânio para o mesmo país que nega o Holocausto e grita “Morte a Israel e à América” a cada soluço.
O que o Brasil ganharia ao favorecer a ditadura de Ahmadinejad e de Ali Khamenei? Essa resposta não obtemos com Celso Amorim. Mas somos informados da preocupação com “se firmar no Irã a convicção de que a penalidade [as sanções econômicas] a que estava submetido se deveria, sobretudo, à circunstância de ser um país islâmico (e adversário de Israel) ou antiocidental, acentuando a sensação de discriminação”.
Oh, tadinhos! Só porque querem urânio enriquecido, e preferem viver sob sanções a buscar outras fontes de energia! Não dá para entender, né? Só mesmo o Super Brasil de Lula para resolver o “problema” nuclear iraniano (assim, colocado entre aspas) — numa curiosa aproximação entre Lula e Obama, que acabou entregando a Teerã, com apoio brasileiro, seu tão sonhado programa nuclear. Troque-se o nome Irã por Alemanha nazista, um regime tão adorado por Ahmadinejad, e veja-se a mágica ocorrer.
Celso Amorim gasta tempo terçando alguma crítica ao regime do Irã, famoso por chicotear mulheres (que mal podem mostrar os olhos, enquanto usavam biquíni antes da revolução de 79), apedrejar mulheres “adúlteras” (como casar depois de o marido morrer) e atirar gays de prédios? No máximo um muxoxo como dizer “que pudesse ter minhas reservas quanto à natureza confessional do regime dos aiatolás”. Termo cirurgicamente brando – até a Argentina é um Estado “confessional”. Muito diplomático. Você já viu alguma feminista ou alguém do PT e do Psol reclamar do “machismo” do país apoiado pelo PT? Nem eu.
O caso é ainda mais tenso envolvendo Israel e o Hamas. Tudo porque a própria existência do Estado de Israel na região incomoda os novos melhores amiguinhos do PT: do Irã ao grupo terrorista Hezbollah, que Lula quer tratar como alguém capaz de “negociar a paz” (sic). Afinal, judeus não são bem vindos — seja por Ahmadinejad, seja por seus braços militares por procuração Hamas e Hezbollah (e Irmandade Muçulmana, e Jihad Islâmica e tantos outros). E como as colônias de judeus são vistas por políticos “anticolonialistas”, como Lula, Obama e Biden?
Israel é um país criado em 1948, em uma região que ficava sob domínio territorial britânico. Após o genocídio da Alemanha nazista na Segunda Guerra, o entendimento era o de que judeus — que nunca formaram um Estado europeu, e foram colonizados e perseguidos na Palestina desde o Império Romano, alguns anos depois do Novo Testamento — deveriam ter um país reconhecido. A sua própria existência moderna, portanto, baseia-se em assentamentos, em ocupação territorial — causando o problema “colonial” a outros habitantes de ter de conviver com judeus nas redondezas. O PT e a esquerda, que adoram chamar todo discordante de “nazista”, não parece ter muita tranquilidade para explicar por que defende que o Hamas não seja terrorista e tenha uma “causa justa” por não querer ver judeus na vizinhança.
Já nos acostumamos ao fato de deputados que dificilmente saberiam diferenciar a Arábia do Kuwait no mapa terem opiniões tão maníacas sobre diversos temas, como o Hamas ou o direito de Israel existir — curioso direito que nunca é questionado sobre Campos de Goytacazes, Escandinávia ou Coréia do Norte. Apenas quando judeus estão envolvidos é que parece haver um questionamento até à existência do próprio Estado. O que fazer com os judeus que neles habitam é uma pergunta interessante a ser feita a Gleisi Hoffmann ou Orlando Silva.
Ideologia anticolonial, submissão teocrática
O entendimento dos petistas — e da esquerda em geral — era e é a clave do colonialismo. O Brasil, terceiro-mundista, seria um joguete nas mãos das grandes potências. O que os petistas chamam de ser “ativo e altivo” e deixar de ser “colonizado” é um alinhamento quase automático — quando não obsessivo — com os piores regimes do planeta. Assim, o Brasil não mais teria uma aproximação com EUA e Inglaterra — tão criticados durante a gestão FHC — mas passaria a tratar “emergentes”, não raro de gosto discutível, como aliados na “luta contra o imperialismo”.
O anticolonialismo é uma leitura de que todos os governos que lutem contra as grandes potências fazem uma luta justa por isso. Não é costume em meios anticoloniais levantar a mão e perguntar o que seriam desses países sem as “colônias”. O rei da Síria Ali al-Hashimi, em 1920, estava tão animado com os progressos que judeus traziam da Europa que afirmou: “Nós, árabes… vimos com imensa simpatia o movimento sionista”. Afinal, Israel é capaz de dessalinizar água do mar. Ter universidades de ponta no mundo. Ser uma potência cibernética. Criar defesas militares incríveis. E além de irrigação e planejamento urbano moderno, também trouxe para a região… bom, a democracia que a esquerda diz defender. Só há um único problema para esses grupos: Israel é entupido de judeus.
É a ideologia anticolonial que tem sempre uma desculpa na ponta da língua, seja para os ataques terroristas do Hamas, seja para a teocracia absoluta do Irã, seja para Cuba, Líbia (Lula chegou a chamar Kadafi de “meu amigo, meu irmão, meu líder”), Zimbábue ou qualquer outra ditadura horrenda que se autodeclare “anti-imperialista” e anticolonial dando sopa.
O histórico do Itamaraty sempre foi o da negociação pacífica. Não é pouco, e é um papel importantíssimo. O Brasil é uma economia forte, com vasto território, culturalmente conhecido. Países neutros são necessários em conflitos geopolíticos de proporções descomunais: a Jordânia costuma ser o território para se conseguir a paz no Oriente Médio. A Islândia mediou o fim da Guerra Fria. A Suíça virou quase sinônimo de paz. E o Brasil presidiu a própria reunião que criou o Estado de Israel. Virar “ativo e altivo” deveria nos dar bônus melhores do que conviver com Ahmadinejad e Hamas no noticiário.
Desde o PT, toda sorte de ditador aparece tanto na mídia que são como os parentes do interior que resolveram passar uns meses em nosso noticiário sem convite e de lá não arredam pé. O problema não é apenas midiático: o Oriente Médio acaba bagunçado com o apoio “terceiro-mundista” brasileiro (e de vários outros países que financiam o terrorismo e as ditaduras antiocidentais).
Bagunça islâmica com ginga brasileira
Há poucos anos, o complexo “equilíbrio” da região envolvia sopesamento entre teocracias como o Irã e a Síria, Estados seculares como Israel e, de certa forma, Egito e Líbano, e países em processo de “ocidentalização”, como Arábia e Turquia. Se antes havia uma contenção diplomática a ser feita, o desequilíbrio agora é totalmente para o lado da jihad.
O Brasil de Lula tem como parceiros no Oriente Médio, sequentes no noticiário, Irã, Líbia, Síria e a Palestina — e uma relação no mínimo conturbada com Israel, a única democracia da região. Ser “ativo e altivo” é fácil quando se fala grosso contra a América e a Europa, que, no máximo, vão tolerar o exotismo brasileiro. Mas acabamos virando bastante passivos e subalternos do plano geopolítico do Irã. Que, ao invés de se abrir com o novo amigo ocidental (como fizeram Arábia e Turquia com a América), apenas fortalece sua teocracia e sua opressão sobre a população.
Antes dos atentados do Hamas, Israel e Arábia Saudita tentavam reestabelecer relações diplomáticas. A Arábia Saudita é uma monarquia que vem se aproximando do Ocidente, e até permitiu as mulheres dirigirem no dia seguinte à visita de Donald Trump. Egito, Jordânia e Turquia seguiam pelo mesmo caminho. Russos e chineses, naturalmente, desgostaram um bocado. O ataque do Hamas, com armas dos dois países (e da Síria, um fantoche russo, e da Coréia do Norte, um fantoche chinês), pôs fim imediato às tratativas. Sem Trump e Bolsonaro, sobrou a Netanyahu uma gélida relação com Biden, quase a contragosto. E, agora, enfrentando o Irã cheio de armas, enquanto chora ao Brasil graças às suas sanções.
A Inteligência noorte-americana supõe cerca de US$ 100 milhões por ano de ajuda militar dada pelo Irã ao Hamas. Celso Amorim, em suas memórias, tenta nos acalmar, afirmando que boa parte do acordo comercial com o Irã (sempre lembrado como não-essencial: o principal era conseguir atuar a favor do urânio) envolvia não armas, mas “inocentes frangos”. Resta saber quão inocentes tornaram-se nossos amigos penados. O Irã busca ser uma potência atômica como uma caução para agir contra Israel, tornando-se a maior força islâmica do Oriente Médio — apesar de não ser árabe, ser xiita e falar farsi. Tal como o regime de Assad na Síria só sobrevive com os russos por trás, os iranianos precisam do seu programa nuclear. Para o qual o Brasil foi um dos principais partícipes. Comparsa, talvez.
O território a oeste da Jordânia é entendido pelos muçulmanos como waqf, terra “doada” à força a infiéis. Sem força para derrotar Israel de frente, o modelo de enfrentamento, desde a década de 60, é por ataques à população civil, com forte financiamento iraniano. O terror para derrotar o Estado pelo medo de existir. Hassan Nasrallah, o líder do Hezbollah, afirmou em maio de 2000 que tal tática mostraria que a tecnologia israelense é frágil como “uma teia de aranha”.
Recentemente, Ismail Haniyeh, o líder político do Hamas, encontrou-se com o ministro do Exterior iraniano, Hossein Amir-Abdollahian. Ambos falaram sobre a “ação preventiva” (sic) do Hamas pelo “front de resistência”, que é como o Irã chama a aliança dos dois. O Hamas, que faz Lula enrolar tanto para chamar de “terrorista”, conclamou o mundo árabe e islâmico para chacinar os judeus de vez. Atentados terroristas já voltaram a se tornar rotina nos últimos dias.
Celso Amorim chega a comentar do tom macambúzio, como a ex-ministra de Relações Exteriores israelense, Tzipi Livni, afirmou, que “não é possível dialogar com o Hamas”. Reler estas linhas hoje mostra que a preocupação da ministra era algo mais do que azedume — ou uma teoria da conspiração de extrema direita.
Fonte: Revista Oeste