O depoimento do ex-diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Saulo Moura da Cunha à CPMI do 8 de Janeiro, na terça-feira 1º, fez nascer um consenso entre parlamentares da base e da oposição: o indiciamento do general Gonçalves Dias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do governo Lula, ocorrerá ao fim dos trabalhos.
Isso porque Cunha confirmou aos parlamentares que, por ordem de G. Dias, adulterou um relatório de inteligência enviado ao Congresso em janeiro. Cunha omitiu do documento os alertas da agência a G. Dias sobre a ameaça de invasão aos prédios dos Três Poderes, em Brasília, que, de fato, ocorreu em 8 de janeiro.
“Fiz o primeiro (relatório) em uma planilha que continha os alertas encaminhados pela Abin a grupos e continha também os alertas encaminhados por mim pessoalmente, pelo meu telefone, para o ministro-chefe do GSI. Entreguei essa planilha ao ministro, e ele determinou que fosse retirado o nome dele dali porque ele não era o destinatário oficial daquelas mensagens. Que ali fossem mantidas apenas as mensagens encaminhadas para os grupos de WhatsApp. Ele determinou que fosse feito, e eu obedeci à ordem”, declarou Cunha, na CPI.
Depois de conversar com deputados e senadores da comissão, a coluna de Malu Gaspar, de O Globo, informa, na edição desta quarta-feira, 2, que até mesmo parlamentares da base do governo Lula afirmam que o indiciamento é inevitável. Entretanto, o crime cometido ainda não está claro, mas uma das possibilidades em avaliação nos bastidores é enquadrar Gonçalves Dias em um dos crimes previstos contra o Estado Democrático de Direito.
Até mesmo a senadora governista Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da CPI, durante o depoimento já deu mostras do que pode ocorrer com G. Dias. “O senhor está dizendo que adulterou a pedido de G. Dias. Atendeu a uma ordem absurda dele, atendeu ao pedido de uma ilegalidade. Retirou um dado e não apresentou no relatório apresentado à CCAI. Há uma responsabilidade compartilhada por ter atendido a uma ordem absurda. Que fique isso claro”, declarou Eliziane a Cunha, na sessão de terça-feira.
“As acusações do Saulo Cunha são gravíssimas e mostram que o general agiu de má-fé, dando uma ordem ilegal de remover informações do relatório. Houve sabotagens por todos os lados”, disse um integrante da comissão à coluna de Malu Gaspar, sem ter a identidade revelada.
O relatório adulterado foi enviado à Comissão de Atividades de Controle de Inteligência (CCAI) do Senado em 20 de janeiro e continha as mensagens disparadas entre 2 e 8 de janeiro pela Abin a diversos órgãos e autoridades. Na primeira versão do documento não constavam as mensagens enviadas diretamente ao celular de Dias, pelo aplicativo de mensagens WhatsApp. No total, 11 alertas enviados ao general foram suprimidos do primeiro documento.
O segundo relatório, integral, com os alertas ao ex-ministro, só chegou ao Congresso em maio, por meio de um novo relatório da Abin. A segunda versão chegou à CCAI depois que a Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou os informes. Nesta época, G. Dias já não era mais o chefe do GSI.
Gonçalves Dias, amigo de Lula de longa data, que trabalhou na segurança do petista nos dois primeiros mandatos e na campanha de 2022, pediu exoneração do GSI em 19 de abril, depois de imagens obtidas pela CNN — até então sob sigilo decretado pelo governo — mostrarem que ele estava dentro do Planalto e que interagiu normalmente com os vândalos que depredaram o prédio.
Saulo Moura da Cunha, que era o chefe da Abin quando Dias deu a ordem de adulteração do relatório, deixou o cargo em março e passou a ocupar uma função no GSI, sob o comando de Dias. Entretanto, pediu exoneração em 1º de junho.
Fonte: revista Oeste